Confira artigo de Sahil Bhambhani, Advogado do escritório Agrifoglio Vianna.
No Seguro Auto, além das coberturas de Responsabilidade Civil Facultativa (RCF) e Acidentes Pessoais de Passageiros (APP), é tradicional a contratação da cobertura compreensiva, que visa proteger o veículo segurado de colisões, roubos ou furtos. Pois bem. É sabido que, por vezes, a sociedade atravessa momentos de exacerbada tensão social, por motivos que vão desde a conturbação política, como nas manifestações de junho de 2013, ou até mesmo ataques perpetrados pelo crime organizado com o intuito de retaliar determinadas ações do Poder Público, sendo o caso mais notável os ataques sofridos pela cidade de São Paulo, a maior do país, no ano de 2006. Tal situação, infelizmente, ainda que extraordinária, já ocorreu nas maiores cidades do Brasil.
O que se observa, nestas ocasiões, é um aumento significativo de sinistros sofridos por veículos estacionados nas ruas, ônibus públicos e até mesmo estabelecimentos comerciais, vítimas de vandalismo, depredações e incêndios criminosos. Verifica-se, na maioria destes casos, que se trata de risco excluído pelos contratos avençados entre Segurado e Seguradora.
Neste sentido, cabe indagar se estariam cobertos ou não os danos decorrentes da perturbação de ordem pública, e se a cláusula de exclusão é abusiva perante as normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
De acordo com o Art. 757 do Código Civil, o segurador garante o interesse legítimo do Segurado contra os riscos predeterminados. Isto pois para cálculo do prêmio e do capital segurado, há rigoroso cálculo atuarial, de acordo com as leis dos grandes números. Assim, o elastecimento (extensão) da cobertura é impossível, tendo em vista que foram pagos os prêmios somente para os eventos contratualmente determinados.
Assim, havendo cláusula de risco excluído, tal situação não foi contemplada no cálculo do prêmio, mesmo após a mensuração do risco.
Os atos de vandalismo se caracterizariam como risco extraordinário, isto é, não são submetidos a uma estatística regular, em face de sua abnormalidade. Podemos exemplificar a questão tratando de uma frota de veículos de um ente público, devidamente segurado após a realização de processo licitatório.
O prêmio, neste caso, é pago com base em cálculo estatístico elaborado pela Seguradora, após análise dos sinistros ocorridos, e sua extensão e frequência. Imagine-se que, após um evento esportivo, com uma circulação de milhares de pessoas, todos os veículos estacionados, ou sua grande maioria, sejam vítimas de vandalismo ou incêndios criminosos.
Evidentemente que, neste caso, o número de sinistros foi tão elevado, em um espaço tão curto de tempo, que não foi possível constituir as provisões técnicas para suportá-los. Tal evento não estava estatisticamente mensurado e não foi pago prêmio para tal. E, neste sentido, é dever da Seguradoras zelar pela constituição de fundos mutuais e sustentáveis, sob pena de afetar todo o seu grupo segurado.
Na mesma esteira é que costumam ser excluídos, via de regra, os sinistros decorrentes de terremotos, atentados terroristas e outros eventos totalmente anormais ou catastróficos.
Veja-se que, sim, os riscos extraordinários podem ser objeto de cobertura. Mas, para tanto, é imprescindível o pagamento de prêmio para tal, o que é um princípio basilar do direito securitário.
Assim, a exclusão do risco por atos decorrentes de vandalismo não se trata de cláusula abusiva, como muitas vezes é vindicado, mas sim de respeito às cláusulas contratuais e zelo com a coletividade segurada. Trata-se, é verdade, de uma restrição, mas que é admitida pela legislação consumerista, desde que adequadamente informado o consumidor.
Neste sentido, considerando o cenário que se avizinha, de tensionamento político, especialmente as eleições de 2022, existe a grande probabilidade que ocorram protestos ou passeatas, estes perfeitamente legitimados dentro da nossa democracia. Lamentavelmente, entretanto, há também a possibilidade de tais movimentos sofrerem infiltrações de vândalos, com extensos danos sendo infligidos à veículos particulares ou públicos.
Nestes casos, a não ser que seja expressamente pactuada a contratação para tal fim, é perfeitamente aplicável a exclusão do risco no seguro auto, sendo legítima eventual negativa emitida pelas seguradoras.
Texto escrito por Sahil Bhambhani, Advogado do escritório Agrifoglio Vianna.
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