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Foto do escritorLúcio Roca Bragança

A inaplicabilidade do código de defesa do consumidor aos Seguros de Vida em Grupo não-contributários

Atualizado: 19 de ago. de 2022




O Código de Defesa do Consumidor costuma ser aplicado quase que indistintamente a quase todas as modalidades de seguro. Mas será que ele tem essa abrangência toda? Aqui vamos examinar especificamente o caso dos seguros coletivos suportados pelo Estipulante.

A resposta encontra-se estampada no §2º do art. 3º do CDC, que exige, como elemento essencial para a caracterização da relação de consumo, a existência de remuneração. Por conseguinte, nos seguros de vida em grupo não-contributários, o vínculo dos Segurados com a Seguradora não se caracteriza como relação de consumo, por carecer deste requisito. Como, in casu, o prêmio é suportado integralmente pelo Estipulante, e os Segurados nada despendem, não se faz presente a prestação de serviço “mediante remuneração” e, consequentemente, a relação entre Segurado e Segurador não possui os elementos definidores da relação de consumo.

Por outro lado, é preciso atentar para os casos em que há uma remuneração oculta, ou indireta, como adverte Cláudia Lima Marques em seus comentários ao Código Consumerista.[1]:, já que, frequentemente, aquilo que é propalado como gratuito não o é.

Em relação ao Seguro de Vida em Grupo não-contributário, poder-se-ia arguir que, nas apólices estipuladas pelo empregador, haveria uma remuneração indireta, pois, embora o valor do prêmio seja pago pelo empregador, trata-se de uma contraprestação pelo trabalho do empregado. A força de trabalho do empregado, neste caso, estaria sendo remunerada também através do prêmio suportado pelo empregador. Deste modo, seja o seguro contributário, ou não, a origem dos recursos estaria sempre no Segurado, conforme percebido pela doutrina norte-americana.

2]: “…viewed realistically either type of group insurance plan involves a contribution by the employee because the employer’s contribution – whether it is the total premium or only part of it – is made as part of the total compensation which is being paid for the services of the employee.”

Porém, se o seguro em grupo não-contributário estipulado pelo empregador for considerado como remunerado indiretamente pelo Segurado, então o pagamento do prêmio consistirá em uma parcela remuneratória, parte integrante dos vencimentos, permeada de natureza trabalhista e não será possível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, já que o art. 3º, § 2º descaracteriza tais relações como sendo de consumo (“…salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista).

Como ficam, contudo, o caso dos seguros coletivos não-contributários estipulados por uma associação, em que o Segurado paga uma mensalidade à associação? Nestes casos, não há a contribuição direta do prêmio por parte dos Segurados, que tão-somente suportam os custos de existência e manutenção da entidade associativa. Ainda que a Associação se utilize dos recursos alcançados pelos associados para a contratação de uma apólice em grupo, a natureza indireta do vínculo é muito tênue, assim como tênue também é a posição de vulnerabilidade do Segurado. O Estipulante possui forte poder de barganha, podendo migrar o grupo segurado para outra seguradora a cada aniversário, o que lhe permite influir nas coberturas e garantias contratadas – fato que não se dá com um segurado isolado.

Nestes termos, é preciso reconhecer, primeiro, que o Código de Defesa do Consumidor cumpre singular e insubstituível papel social na regulação das relações de consumo. Os valores constitucionais em que se acha fundado e o lauto fim a que se destina, de combate ao arbítrio, à exploração e à desigualdade fazem com que se deva buscar a sua aplicação da forma mais abrangente possível. Devem ser respeitados, todavia, os conceitos fixados no próprio Código acerca da conceituação de fornecedor, consumidor e relação de consumo, bem como o caráter de critério econômico por ele adotado. Estas limitações fazem com que a norma consumerista não seja automaticamente aplicável em todos os ramos securitários, entre elas os seguros de vida em grupo não-contributários.

[1]Comentários ao Código de Defesa do Consumidor: arts. 1º a 74 – Aspectos Materiais. São Paulo: RT, 2003, p.94.

[2]KEETON, Robert E.; WIDISS, Alan I..Insurance Law: A Guide to Fundamental Principles, Legal Doctrines and Commercial Practices. Saint Paul: West Group, 1988, p. 110.

Artigo produzido por Lúcio Roca Bragança | Agrifoglio Vianna Advogados Associados


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